Renata Pallottini , escritora, poeta, educadora
Renata Monachesi Pallottini nasceu em São Paulo em 1931). Poeta, romancista, contista, autora de literatura infantil e juvenil, dramaturga, tradutora, ensaísta, roteirista e professora....
Revista digital de Arte e Cultura
1. De Raymundo pra Raymundo
De nome Raymundo Filho
Filho de Raymundo pai
Nascido na Paraíba
Eu na terra dos pinheirais
Também aprendi na vida
Rimar bem menos com mais
Nasci meio violeiro
Poeta e cantador
A querer menos que tenho
Pra agradar nosso senhor...
Bárbara Lia: Esta bela canção é também uma mini-biografia. Fale do papel que seus pais tiveram nesta tua opção pela música.
Raymundo Rolim - Na verdade, esta canção nasceu de um livro que escrevi sobre meu pai pelos seus oitenta anos (papai faleceu há dois anos com 98). Como ele teve uma vida agitadinha: sendo vaqueiro no sertão da Paraíba onde nasceu jóquei, agitador, guerrilheiro, e com minha mãe teve dezenove filhos, achei que nos oitenta anos dele lhe cairia bem um livro, e no dia do seu aniversário ele deu presente pra cada filho: um livro autografado. Então a letra desta música saiu na verdade da consecução deste livro. Fiz o mesmo com mamãe que nove anos mais nova que ele e nos seus oitenta anos também ganhou o seu livro. Mamãe sendo filha de italianos, de primeira geração nascida no Brasil, era a cantora da casa dela, e sempre levantou cantando, sempre de bom humor e de boa vontade com a vida. Papai também era afinado e gostava de cantar de vez em quando. Mamãe também gostava de cantar tangos e marchinhas de carnaval e como meu pai sendo pastor evangélico, aprendi a ouvir os hinos que eram muito melodiosos... E foi assim- uma casa cheia de filhos - mamãe criou treze da tribo que nos nasceu e de música. Mamãe tocava acordeom-ela e papai também compuseram algo. Em casa todos nasceram músicos e cantores. Uma voz mais bonita que a outra, ou seja, havia então certo apreço pelas artes.
O dono da voz
Bárbara Lia: Lendo recentemente o livro – Pitágoras e a Harmonia das Esferas – da escritora francesa Simonne Jacquemard, ela destaca a importância primordial da música entre os Pitagóricos. Pitágoras saia na noite para ouvir a sinfonia das esferas e maravilhava-se com o som de milhares de abelhas sobre as tílias em flor. Mesmo o som das palavras é música. Não tenho formação musical, no entanto, amo música como todos... O que a música significa para Raymundo? Como nascem as suas composições?
Raymundo Rolim - Ah, as composições nascem como crianças, sendo que estas não são trazidas por dona cegonha. A cegonha na verdade tem de parir as suas canções... É aquele trabalho como tudo na vida. Até fazer neném dá trabalho. Algumas músicas estão prontas aí nas esferas invisíveis, outras a gente agarra na marra, e outras a gente compõe por não ter outro jeito (risadas). A música representa pra mim uma oportunidade de eu comungar comigo mesmo... E caso fique interessante a música que eu faço, mostro aos outros e se eles gostam, penso que estou no caminho, pois consegui comunicar algo que eu só percebi na minha alteridade, e consegui passar para outro que entendeu também e tem até os que gostam (mais risadas). A música é uma chance que os passarinhos me dão para poder apreciá-los melhor, por dentro de suas penas.
2 .No meio do caminho tinha um cesto de pedras
Bárbara Lia: Como você trafega interiormente entre a poesia e a música? Qual o papel que a literatura ocupa em sua vida? Você integrou a bela Coletânea Bife Sujo e publicou o livro Então o amor vem e te ama pela Fundação Cultural de Curitiba. Você tem planos para novos livros em prosa ou verso?
Raymundo Rolim: Bem, em matéria de juízo eu nunca fui muito bom, quero dizer de ter juízo. Tão e tal ignorante ainda me sinto e o meu desconhecimento sobre as coisas é ainda maior. Esses dias vi na internet que o Hubble fez umas fotos... Só numa galáxia há oitocentos bilhões de sóis. O que eu posso querer? Claro que essa galáxia é minha. Amei a foto. Então, a literatura é o meio pelo qual eu gostaria de me expressar quando não mais tiver juízo-vou falar todas as tranqueiras que nunca ousei... Estou aí com um livro de contos (me diverti muito escrevendo e ri muito mesmo – pra isso que serviu pra eu me rir...) o livro ta prontinho só falta fazer - isto é, mandar para alguma editora. E as poesias, bem, as poesias ou as letras das músicas, eu as como com farinha e cachaça morreteana- fazem parte da minha dieta distinta.
3. Ópera da Cidade
Bárbara Lia: Conte sua experiência teatral quando da montagem do espetáculo – Ópera da Cidade?
Raymundo Rolim: Foi a experiência mais trucidante da minha vida. Até então eu trabalhava há vinte e um anos na UFPR... Aí fiquei tão triste que pedi demissão sumária. Houve umas coisas inúteis de pessoas mais ou menos inúteis que puseram tudo a perder... Mas como eu as aceitei pra trabalhar junto, creio que a culpa foi minha mesmo. Eu tinha planos com a Ópera, juro, e ainda tenho... Um dia ela sai para o mundo... É um bom musical com uma boa história universal que existe em todas as cidades... Toda cidade tem o seu maluco, o cego sanfoneiro, aqueles que toda cidade conhece e gosta, mas ninguém leva pra casa. É um musical e felizmente tenho alguns parceiros em algumas obras... Ficou muito boa...
4. "Chapéu velho" e "Pé na estrada"
Bárbara Lia: Ter um parceiro é dividir o caminho. Na sua trajetória musical e poética por quantos caminhos você caminhou ao lado? E com quem? O que aprendeu nestas “viagens”?
Raymundo Rolim - Aprendi que navegar é preciso mesmo e que a vida é mais curta do que a gente quer ou precisa... Mas também é longa o suficiente para que possamos cometer um numero incalculável de bobagens e depois termos uma galáxia pra aprender a contar seus sóis e uma eternidade pra nos redimir.... E ainda tem umas pessoas que dizem que a gente acumula o tal do Karma... - Virgem Maria três veiz – quem é que agüenta com tanta idiossincrasia?Nem o papa se segura. É melhor falar baixinho e pensar amenidades alhures. Tenho alguns parceiros musicais sim... um melhor e mais maravilhoso que outro ... desde meu irmão Rubem, Eliane Bastos minha amiga e grande cantora ...(que compõe também grego) até Michel Butnariu, o lindo que é o Serginho Natureza, Hilton Barcellos, Ivan Avi, Ricardo Petracca, Ih, to ficando velho ...tô esquecendo mais de duzentos parceiros... seus nomes e datas de aniversário .... e aprendi nessas viagens que um bom parceiro ou parceira faz toda a diferença .... a gente pode querer ir até próximo a pauta ou o pentagrama ou se embrenhar nos braços da eternidade e depois inventar uma bobagenzinha qualquer para se redimir .... de qualquer besteirinha ...
5. Litlle Town
Bárbara Lia: Atualmente você vive em uma cidade serrana – Morretes – Rio Nhundiaquara no fundo do quintal, orquestra de pássaros, uma porção de cães ao redor. E o mundo mergulhado – talvez tardiamente - na questão ambiental. Como o poeta vê, pensa e age quanto a este tema?
Raymundo Rolim - Now I live in a very small town.... there are many mountains around.... Nhundiaquara behind my house .... hummingbirds flowers and trees ... and a train crossing the river over the bridge ... So I live in this very small town ... Aqui tem tanta ambiência, polivalência temos mais de trinta rios ... serras pássaros, cachoeiras que acabo por nem querer pensar em mais nada ... fico aqui ao pé disso tudo, e isso tudo ao pé de mim. O problema mesmo sou eu ...risadas. Perdoe-me, mas não penso mais ... só se me escoltarem ...aí pensarei ....
Raymundo Rolim por Raymundo Rolim
Gosto de samba, de valsa de tango e bolero... Gosto da noite do dia... Da chuva e do sol... Gosto de gente amo os bichos... Gosto de frevo e maracatu... Baião só se for de dois... Xaxado e xote... Gosto do rock e das baladas... De música de raiz... De moda de viola, e amo os meus amigos, mas eles pouco sabem disso e também não sabem que são meus amigos, e que sem eles eu também não quero ficar mais aqui. Podem acertar as contas e vamos para outro boteco, pois a festa continua... Ou para outro templo, desde que seja a gente mesmo... Pois a grande viagem é a pessoal aquilo que na gente faz da gente... Com a gente. Oh, meu Deus! Vamos passear comigo? Eu te levo prum cantinho e canto uma moda pra tu, e te mostro os meus cachorros e meu violão e o sonho que sonhei antes mesmo de nascer ... E se tu te comportares mostro-te uma lágrima minha, que herdei de minha mãe e uma ruindade danada que peguei de meu pai. Vamos, te comportes... Que eu te levo passear. Ah, te mostro também o ninho da Curruíra que já ta chocando ovinhos e onde enterrei Praiana, a Cã que achei na praia e me ensinou a amar, e me deu uma canção... Nem te conto de meus amores... Tu o sabes! Posso também dividir os beija-flores contigo... E as borboletas e o Nhundiquara e a Jaqueira e os insetos...
Raymundo Rolim- Poeta, compositor, autor de teatro. Graduou-se em filosofia pela Universidade Federal do Paraná. Em 1992 gravou o primeiro disco, com quatro composições de sua autoria em São Paulo, acompanhado de músicos da Banda Mantiqueira. Autor de peças de teatro, com destaque para o musical Ópera da cidade (1995), é membro fundador da Associação dos Compositores do Estado do Paraná e coordenador administrativo da TV Comunitária. Lançou em 1996, pelo selo RB Music, o CD Coletânea no qual incluiu catorze composições de sua autoria. Compôs entre outras: Apronto; Chapéu velho (c/ Sergio Natureza); De Raymundo pra Raymundo; Fado breve; Fica mais comigo; Ilha do sul; Isabel & Zabelê; Juan y Maria; Má notícia; Negócio da China; O melhor do amor; Outra modinha; Pé-de-rosa; Play; Venho de mim.
Para saber mais:
http://www.dicionariompb.com.br/raymundo-rolim
http://www.buscamp3.com.br/musicas-do-artista/1619/raymundo-rolim
Bárbara Lia é professora de História e escritora. Vive em Curitiba. Livros publicados: O sorriso de Leonardo (Poesia, Edições Kafka - 2.004); Noir (Poesia, ed. do autor – 2.006);O sal das rosas (Poesia, Lumme editor – 2.007);A última chuva (Poesia, ME – ed. alternativas – MG – 2.007);Solidão Calcinada (Romance, Secretaria da Cultura / Imprensa Oficial do Paraná - 2008); Constelação de Ossos (Romance, Ed. Vidráguas - 2010);T em um pássaro cantando dentro de mim (Poesia, 2011 - edição independente); A flor dentro da árvore (Poesia - edição independente).
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