Renata Pallottini , escritora, poeta, educadora
Renata Monachesi Pallottini nasceu em São Paulo em 1931). Poeta, romancista, contista, autora de literatura infantil e juvenil, dramaturga, tradutora, ensaísta, roteirista e professora....
Revista digital de Arte e Cultura
Renata Monachesi Pallottini nasceu em São Paulo em 1931). Poeta, romancista, contista, autora de literatura infantil e juvenil, dramaturga, tradutora, ensaísta, roteirista e professora. Estudou Direito na Universidade de São Paulo - USP e Filosofia na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP, formando-se, respectivamente, em 1951 e 1953. Ainda em 1951 começa a trabalhar como revisora na Tipografia Pallottini, de sua família, onde, no ano seguinte, quase manualmente, imprime seu primeiro livro de poemas- Acalanto. Ingressa no curso de Artes Cênicas da Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo - EAD/USP. Forma-se em 1964 e dá início à carreira de docente, tradutora e estudiosa de teatro e televisão. Faz sua estreia na prosa de ficção com o livro de contos Mate é a Cor da Viuvez, de 1974, e dez anos depois lança seu primeiro trabalho para o público infantil, Tita, a Poeta. Em 1991, viaja a Cuba como professora visitante da Escuela Internacional de Cine y Television. Tem uma obra vasta nas áreas de poesia, prosa, ensaios, literatura infantil, paradidáticos e teatro. Foi agraciada com o Troféu Juca Pato 2017, pelo conjunto de sua carreira e especificamente por seu mais recente livro de poemas, Poesia Não Vende, publicado em 2016 pela Hucitec Editora.
Ao longo da minha carreira entrevistei a Renata duas vezes: a primeira foi para um perfil publicado no suplemento Cultura de O Estado de São Paulo em 26 de agosto de 1979 que pode ser lida, atualizada, neste link http://vitabreve.com/artigo/47/renata-pallottini-:-consciencia-do-trabalho-urgente-e-humilde/ e a segunda foi esta, realizada no dia 4 de maio de 1993 para a minha tese de mestrado intitulada Diálogos com a Educação, defendida na Unicamp sob orientação do professor doutor Joaquim Brasil Fontes . Aqui trato especificamente da autora como educadora enfatizando sua carreira como professora e sua visão da universidade brasileira
P.-Renata há quanto tempo você dá leciona?
Renata Pallottini - Relativamente pouco tempo porque eu fiz outras coisas antes, por exemplo, advoguei durante dez anos. Dar aula eu comecei meio esporadicamente em 1964 na EAD de forma não regular e sem nenhum vinculo. Eu estava substituindo o Sábato Magaldi que tivera problemas e eu assumi dando as aulas dele na disciplina de História do Teatro Brasileiro. A EAD era ainda uma escola particular do Alfredo Mesquita. Ou seja, não tinha nenhum vinculo, não tinha carteira assinada, não tinha salário, como, aliás, a maioria dos professores de lá.
P. Você havia estudado lá não é?
R.P. - A EAD era uma coisa muito séria. Eu entrei para a EAD quando o Alfredo Mesquita inaugurou um curso de Dramaturgia e Critica anexo ao curso de Interpretação. Eram dois anos: então fiz 1961, 1962 e em 1963 continuei ligada a Escola, porque eu gostava muito de lá - fiquei assistindo umas aulas como o Anatol Rosenfeld que era uma pessoa extraordinária. E como eu estivesse ligada, em 1964 o Sábato que dava Teatro Brasileiro não pôde continuar e eu assumi o lugar dele. Eu nunca tinha tido planos de dar aulas, nunca tinha pensado nisso - eu era uma advogada e estava trabalhando num escritório, já escrevia, já tinha livros publicados.
P.- Já tinha peças publicadas ou montadas?
R.P. - Tinha coisas escritas, mas não tinha estreado ainda profissionalmente. Eu estreei profissionalmente no teatro em 1965. Na poesia eu já tinha coisas publicadas, mas no teatro estava justamente começando a escrever na Escola. Foi lá que escrevi meu primeiro texto que foi O Crime da Cabra. Antes eu tinha feito tentativas, mas nada organizado. O Crime da Cabra eu comecei a escrever na Escola como exercício de criação. A primeira versão foi para a televisão-foi encenada no Canal 9, TV Excelsior e só depois eu fiz outra versão para teatro. Então em 1964 eu tinha coisa escritas e estava fazendo alguma coisa para a televisão. No teatro não tinha feito quase nada.
P- E na EAD você ficou até quando dando aulas de história do Teatro Brasileiro?
R.P. - Até 1963 quando a EAD passou para a USP. O Alfredo Mesquita conseguiu um encontro de interesses porque ele sentia que a Escola estava ficando grande demais e ele estava sem recursos para mantê-la. E havia essa oportunidade de passá-la para a USP que era uma coisa que ia modificar e de certa maneira garantir a existência da Escola.
P.- Até então era ele que a mantinha?
R.P. - Era ele. Ele pagava os professores como podia. Na USP eu continuei dando aulas na EAD, mas então fui convidada a dar aulas na ECA (Escola de Comunicações e Arte) no Departamento de Teatro. Aí já ia ser outro teor porque a EAD era de nível médio. Na ECA eu passei a dar aulas de Dramaturgia em 1968 e também fui para substituir um professor que estava se afastando que era o Jorge de Andrade. Ele não tinha se adaptado ao trabalho da ECA. E acabei me interessando muito mais por Dramaturgia do que meramente dar aulas de História do Teatro. Eu me interessava mais pelo texto tanto que depois de um tempo na própria EAD passei a dar aulas de Literatura Dramática como hoje em dia eu trabalho com Dramaturgia na própria EAD.
P.- Eu gostaria que você falasse um pouco mais da Escola de Arte Dramática ainda no tempo do Alfredo Mesquita, a famosa sopa, etc.
R. P.- Bom a EAD era um encanto porque ela tinha um esquema todo especial. As aulas começavam as 19.30h, mas a gente chegava do trabalho- era raro quem não trabalhasse em outras coisas - entre alunos e professores. Então a gente chegava ai por 19 h e descia la para o porãozinho e era servido um jantar , uma sopa. A principio o Alfredo mandava buscar da casa dele, a sopa era feita na cozinha da casa dele e a principio iam os panelões de sopa da casa dele, todo santo dia para a EAD. Mas aí começou a ficar muito complicado e se começou a fazer essa sopa na cozinha da Escola. Então era servida uma sopa, um pãozinho, uma sobremesa e um cafezinho. E aquilo quebrava um imenso galho para todos nós porque não havia tempo para ninguém ir para casa e muitos ali nem poderiam pagar um lanche ou coisa parecida. Aquilo era gratuito para os alunos e eu acho até hoje uma compreensão do problema humano da parte do Alfredo Mesquita que era uma coisa sensacional. Ele era realmente uma pessoa finíssima, maravilhosa.
P. -Eu me lembro , quando fazia teatro ainda em Campinas de irmos- o grupo todo, o TEC (Teatro do Estudante de Campinas) junto com a Tereza Aguiar ver os exames públicos da EAD e sempre achava tudo aquilo tão mágico, tão lindo, e me lembro do Alfredo Mesquita nos recebendo. Olha você contando isso agora, com detalhes, porque essa coisa da sopa é famosa, acho mais incrível ainda. Mas mudando de assunto ou voltando a ele: atualmente você leciona que matérias?
R.P. -Literatura Dramática na ECA e Dramaturgia-Teoria e Prática na EAD.
P.-Como você vê o diálogo da tua disciplina com a Educação? Como você acredita que se dê a relação teatro e educação, entendendo educação aqui como processo de crescimento humano, enfim em termos de aprender a ser humano como a fenomenologia define?
R. P.-Como eu te disse outro dia, eu entendo pouco de educação propriamente dita, digamos a teoria, porque eu entrei na coisa muito lateralmente. O teatro é milenar então me parece que a familiaridade com o texto, o aprendizado, o estar perto de uma visão estética da vida em termos de espetáculo faz crescer o ser humano, amadurecer, progredir. É uma especialidade da arte difícil de ser abordada, mas eu não consigo pensar na arte como uma atividade que toque muito as pessoas, porque elas tem problemas que cortam o caminho da aproximação a arte como subsistência. Ha pessoas que não sabem ler, há outras que mesmo que leiam não conseguem se aproximar do fenômeno teatral e mesmo que o fenômeno teatral vá a elas, isso não ocorre. Para não dizer que isso empobrece o teatro - ou seja, sempre que você leva espetáculos de teatro a outros lugares que não o teatro, você perde em termos de espetáculo, em termos de cenário, em termos de dicção. E fora isso a pessoa em geral está mal acomodada, mal sentada, quer dizer tem tanta coisa contra ela que quando a gente vê uma pessoa despreparada que gosta de teatro é um milagre. Enfim eu acho que se aproximar de um texto dramático, que faz você conhecer o mais profundo do ser humano, de seus conflitos, suas buscas, das suas duvidas, enriquece qualquer pessoa.
P.-Você acredita que haja hoje na universidade um relacionamento das disciplinas de forma que se poderia dizer boa, excelente ou apenas razoável na USP? Como seria o ideal para você?
R. P.-Eu conheço a minha universidade, eu conheço a USP e poderia dizer que se dá uma complementaridade, uma inter-relação, não sei se seria ideal, mas é boa. Eu vejo que há experiências interessantes como essa dos cursos para a Terceira Idade. Na minha escola apareceram pessoas maduras que estão a fim de ter contato, de voltar a conhecer coisas. Vejo, além disso, gente da filosofia e do teatro trocando informações, ideias, vejo gente de teatro se relacionando com o pessoal de Letras. Vejo muito a aproximação entre a FAU e a ECA, quer dizer a arquitetura e a cenografia. Claro que não temos muito a ver com a Medicina e a Veterinária. Então eu acho que há uma troca muito boa, pode não ser ideal, mas nada é ideal.
P - Hoje, sabemos mais que nunca, na sociedade contemporânea, o saber está fragmentado pelas próprias circunstancias do desenvolvimento humano, social, tecnológico. Como isso fica na cabeça das pessoas? O que fazer para se ter uma visão de conjunto do saber ou dos saberes da atualidade em sua opinião?
R. P.-Hoje em dia a coisa está tão complicada, ampliou-se tanto o saber que acho que só se pode fazer a síntese através da filosofia, ou então dessa coisa maravilhosa que é a poesia.
P.- O teatro também é uma arte que reúne várias outras...
R. P.-É de certa forma o teatro também, porque o teatro seria a fusão da filosofia com a poesia. Acho que através da arte e da filosofia, através da própria sofia que é a busca mesmo da sabedoria. Eu acho que se fossemos pelo caminho da informática a coisa já enlouqueceu tanto que mal dá para a gente desconfiar. É impressionante hoje em dia a capacidade da informação, o que a informação está dinamizando as relações. É assustador.
P.- O que também é contraditório porque afinal se chegou se está chegando a uma sofisticação tecnológica impressionante numa determinada área, mas em contrapartida não resolvemos problemas humanos básicos. Ou seja, há cada vez mais miséria, mais desrespeito, mais carências de todas as ordens, menos educação, menos cultura.
R. P.- Em certo momento você aperta um botão e passa um documento para a China não é, via fax, via email , e no outro você não consegue falar com uma pessoa do seu país, do seu bairro, da sua cidade, porque esta pessoa está num mundo diferente, porque as condições de vida dessa pessoa são tão diferentes que não há diálogo.
P.- Você teve contato com universidades no exterior, sei que estudou na Espanha, França. Como vê esta questão da interdisciplinaridade lá fora? Você diria que há uma maior integração das áreas em relação às universidades brasileiras ou não? Gostaria que falasse sobre isso.
R. P.- As universidades que conheci e que foi há muito tempo foi a Universidade de Madrid na década de 60 e nem teria sentido eu comparar agora o que acontecia la naquela época com o que acontece aqui na década de 90 numa universidade brasileira. Eu posso dizer que a convivência na cidade universitária de Madrid era uma coisa admirável. Eu saía de uma aula de Letras e ia para um curso na Cidade Universitária para estrangeiros que havia logo depois. Então a s informações que corriam e que a gente podia assistir um
concerto de repente, ou assistir uma aula especial sobre Literatura Espanhola .Dentro da Cidade Universitária existiam as casas de residências de estrangeiros. Na Casa do Brasil era uma casa muito interessante, havia os Colégios que eram habitações. Agora a gente tem que levar em conta que a cidade era muito pequena em termos brasileiros. A Cidade de Madrid era muito menor do que São Paulo , havia menos gente, e eu estive como aluna pouco tempo- em Madrid passei um ano, na Sorbonne eu passei dois meses-eu ia assistir aulas de teatro e foi na década de 70 e Paris é um mundo. Mas não posso dizer que tenha tido muito conhecimento da universidade porque eram coisas muito laterais. Como em 1968 estivesse muito próximo eu vi lá um participação muito grande de estudantes em plena ditadura nossa- era uma efervescência. O que mais me impressionou foi aquela vivacidade maravilhosa dos estudantes. Aqui havia um movimento mas estava sendo muito reprimido.
P.- Que diferença não, entre aqueles tempos, que, aliás, eu vivi os famosos anos rebeldes? E a sua juventude como foi?
R. P.- A minha juventude foi na década de 1950, mas naquele tempo a luta era contra a ditadura de Getúlio Vargas, quer dizer era uma ditadura sui generis- era a luta pelo petróleo é nosso. Mas na década de 60 eu já estava como professora dentro da USP e enfrentei os problemas, a luta, o nível de conscientização era muito grande. Houve uma mobilização muito grande da juventude. Embora a gente tenha tido um movimento bastante ponderado agora com o impeachment (do Collor) houve uma onda muito boa, mas a gente não vê uma continuidade, não vemos a estudantada trabalhando sempre. Eu acho que a juventude está cheia de solicitações, até de sobrevivência, não sei exatamente porque, mas, o que há é que hoje estamos muito desmoralizados. Outra universidade que eu conheci foi Universidade de Havana, ainda que nunca tenha lecionado lá, eu leciono numa escola livre, mas me aproximei muito da universidade. Mas ai já é outro mundo porque é um mundo latino americano, e, além disso, um mundo cheio de problemas. Cuba está cheia de problemas é outro esquema.
P.-Sei que você leciona dramaturgia, mas aplicada ao cinema e a televisão não é? Gostaria que falasse sobre esta experiência.
R.P. Sim é isso, porque é uma Escola de Cinema-é a Escola Internacional de Cinema em Havana.
P.- E você fala em que idioma? Português ou espanhol?
R.P. - No começo era portunhol apesar de eu ter vivido na Espanha, mas eu estava distanciada do idioma, mas em pouco tempo já estava falando com facilidade. Hoje em dia escrevo também em espanhol. Mas tem aluno brasileiro.
P.-E você trabalha que tipo de textos? Apenas os criados pelos alunos ou faz coisas profissionalmente?
R.P. Olha, eu colaborei em roteiros de uma moça mexicana - Maria Novaro e inclusive depois vi o filme e tinha até um crédito para mim. E fiz também um documentário para a televisão peruana. Já colaborei com gente do Peru, Bolívia, Venezuela. A escola é internacional , tem gente do mundo todo mas especialmente da América Latina.
P.- E como você foi parar lá? Pela USP?
R. P.- Não, fui através do Lauro César Muniz que foi para la convidado como autor de telenovela e eles queriam conhecer a técnica da telenovela brasileira e o Lauro falou do meu livro de dramaturgia e levou mesmo e falou sobre mim. Eles se interessaram pelo livro e me convidaram oficialmente através da USP e eu fui pela primeiro em 1988 e fiquei la dois meses. E então voltei todos os anos. Este ano não vou, quero colocar algumas coisas em ordem, mas provavelmente no próximo ano eu volte a Cuba.
P.-Era este livro: Introdução a Dramaturgia editado pela Brasiliense?
R.P.- O livro que o Lauro levou era este mas como esta primeira edição esgotou, ele foi reeditado pela Ática. E o outro também Dramaturgia-Construção do Personagem que saiu em 1989 pela mesma editora. E agora estou indo hoje aliás, levar os originais para a Ática de um novo livro: Dramaturgia para a Televisão, e que é produto dessa vivencia la na Escola de Cinema de Cuba.
P.- Você poderia falar um pouco desses dois livros? Sei que o primeiro é sua tese de doutorado.
R. P.- O primeiro foi uma síntese da minha tese de doutorado. Eu dava aulas na Escola (EAD) nunca tinha pensado em dar aulas numa universidade, enfim fazer carreira universitária, mas afinal eu estava na USP e tinha que fazer doutorado, para progredir. E tive a sorte e fazer doutorado direto, sem o mestrado, sem cursos e tudo o mais, quer dizer um caso excepcional. E fui juntando tudo o que tinha - livros publicados, peças de teatro - isso foi em 1982, prêmios, aquela minha vida até então e requeri para fazer doutoramento direto e consegui. Então fiz e a minha tese foi uma peça de teatro que se chama O País do Sol e junto com a peça havia um trabalho que era uma espécie de introdução do ponto de vista da dramaturgia. Foi essa introdução que eu reescrevi fiz um cortes e tal e foi isso que virou o livro. O segundo não, foi escrito para ser um livro mesmo só sobre o personagem. Isso saiu alguns anos depois.
P.-E esses livros vendem bem?
R. P.-Vendem sim, não são best-sellers, mas tendo em vista o teor da coisa, pode-se dizer que sim. Interessa muito a estudantes de teatro, televisão e cinema e as pessoas que querem conhecer mais as fontes. Mas dentro desse esquema vai bem.
P.- E poesia vejo que publicou também depois da nossa primeira entrevista que foi publicada em 26 /8 / 1979 no Suplemento de Cultura do Estado de São Paulo: Cantar meu Povo que saiu em 1980 pela Massao Ohno , Ao inventor das Aves em 1985 pela J. R. Scortecci e Esse Vinho Vadio de 1988 também pela Massao Ohno. Gostaria que falasse sobre isso.
R. P. Continuo escrevendo poesia e continuo publicando continuo escrevendo livros para crianças - tem um que deve sair agora em julho. Estou com um romance uma espécie de romance que estou preparando que se chama Nosotros.
P.-E que é sobre?
R.P.- É sobre a América Latina, enfim, continuo escrevendo para teatro embora ache que a montagem teatral esteja cada dia mais difícil.
P.- Por falar nisso sei que sua peça Colônia Cecília você criou livremente, sem preocupações com montagem, etc. Gostaria que falasse sobre isso.
R. P.- Como era uma tese, e não havia justamente preocupação em fazer uma peça para montagem, eu pensei em fazer um trabalho á minha vontade para exatamente por em pratica algumas coisas de dramaturgia. Então eu deixei correr. É uma estória de uma viagem de emigração, de italianos, uma viagem entre a Itália e Brasil.
P.- É uma viagem dos seus antepassados?
R. P.- Um pouco de antepassados, uma coisa meio épico-lírico com toda a liberdade, se passa no mar, se passa no Brasil, se passa na Itália, ela tem uma duração de trinta, quarenta anos- o tempo também é longuíssimo, é bem Peer Gyint é bem uma viagem de um lugar para outro. É um delírio, tem muita gente tem muitos personagens, gosto muito dela.
P.- E houve algum diretor interessado em montá-la?
R.P. -Alguns sim, mas voltando aos livros: os de poesia são em geral livros pequenos, editados na maioria pelo Massao Ohno Editor que é ótimo, é um artista gráfico maravilhoso, mas ele não distribui muito. Então não sei realmente se são encontráveis. mas escrevi bastante poesia, teatro, tenho dez, doze peças algumas estreadas. Tenho também textos de televisão que não estão publicados. E tenho três livros para crianças e agora um deles vai sair em julho que é Do Tamanho do Mundo.
P.-Você disse a pouco que vai publicar mais um Coração Americano? Fale sobre isso. Você já tem dois. Vai ser o terceiro Coração Americano?
R.P. É eu estou com um Coração Americano dilatado (risos). O Coração Americano III está acrescido de uma parte toda sobre Cuba. Como já estou com uma vivência de cinco anos em Cuba e eu acompanhei muito a problemática que eles vivem... Por que nesses anos minha visão foi modificada e ampliada. Quando eu cheguei lá em Cuba ainda se estava vivendo um período calmo, eles estavam fazendo ainda sua experiência tranquilamente e seu socialismo, eles estavam tocando. A União Soviética estava de pé ainda, a coisa estava progredindo. Em cinco anos foi uma catástrofe, caiu a União Soviética, caiu o mundo socialista e Cuba ainda é um dos últimos países do mundo socialista e eles estão meio que sozinhos. Estão muito na mira, muito boicotados. Então essa minha visão de cinco anos está nesses poemas. Á parte isso, tenho todo outro volume de poesias inéditas que também se pode publicar, que eu quero publicar. E, além disso, tenho o dever a esta altura da minha vida, de publicar minha obra completa de poesia, pelo menos. A minha poesia não é fácil de encontrar em lugar algum. São edições pequenas e mal distribuídas. Você encontra livros meus em sebos, e quando algum amigo meu encontra vem me contar é uma novidade.
P.- E a sua poesia atual, você diria que tem alguma novidade em relação a de dez anos por exemplo?
R. P.-Novidade não sei . Eu estava lendo ai o Pedro Lira (refere-se ao Ideologia e Literatura) e tem um ensaio em que ele fala- ele é um marxista - de como o irrita a preocupação com a linguagem, com a experiência formal como ele acha que a poesia tem que ter um conteúdo humano que seja importante, para a mudança do destino do homem. Eu não estou totalmente de acordo com ele, porque ele é muito especifico no marxismo dele, mas na verdade o que eu quero na minha poesia é falar coisas para as pessoas. Porque na poesia a gente não pode distinguir conteúdo e forma - acho que nunca vou ser um experimentador de formas, inda mais nesta altura da vida. A minha vida vai mudando, as minhas preocupações vão mudando, os meus assuntos, minha visão de mundo vai mudando. Há seis anos eu não pensava em Cuba e de repente de cinco anos para cá eu escrevi um livro sobre Cuba. Então isso é a vida da gente que vai apresentando novidades. Acho que a forma e o conteúdo devem vir juntos, mesmo porque se as coisas que a pessoa diz não me interessam ela pode dizer uma coisa belíssima, mas não me interessa.
P.- E para a televisão, você tem escrito alguma coisa? Sei que tem um sobre o veiculo. Gostaria que falasse sobre isso.
R. P.-Estou mais interessada em escrever sobre televisão que é este livro Dramaturgia de Televisão que estou levando para a Ática e isso leva pelo menos um ano, mas espero que já entre na programação. Mas trabalhar para a televisão hoje em dia só se fosse para determinadas coisas e que fosse um trabalho que eu pudesse fazer entre outros. Porque a televisão, quando você pega um trabalho grande como uma telenovela ela exige tempo integral. Isso não daria. Mas se pintar um convite para uma coisa que eu goste de fazer, ai sim eu aceitaria. Nesse momento estou pensando mais em discutir a televisão, principalmente a ficção de televisão, porque tudo isso se ligou com o meu trabalho na Escola Internacional de Cinema de Cuba.
P.-E você tem viajado para a Europa? Sei que gosta muito da Espanha?
R. P.- Não, não tenho infelizmente para a Espanha gostaria muito de voltar. Mas quando aparece um convite bom eu tenho outra coisa. Então em dezembro do ano passado passei no Peru em tempo integral em Cusco dando um curso de dramaturgia para gente que faz vídeo, foi muito bom. Quinze dias em tempo integral, uma coisa gostosa onde você fica o tempo todo com pessoas, profissionais, gente de cinema e TV. Eu aproveitei muito e eles também. Este ano não tenho planos de sair do Brasil, justamente par dar acabamento no livro, procurar editor, coisas assim. Mas pintando um convite interessante eu vou. Tenho muita vontade de voltar para a Europa, só que la você precisa de muita grana.
P.- Voltando a universidade eu gostaria de saber sua opinião. Às vezes olhando a universidade- e estou pensando na Unicamp especificamente, que é onde eu estou no momento- meio alheio, meio fora do mundo. Você sente isso ou não? Como você vê a universidade, no teu caso a USP, como instituição em relação à sociedade global? Afinal qual a função da universidade em sua opinião?
R. P.- Eu conheço melhor a USP e então o que possa dizer sobre a Unicamp é o que ouço dizer, o que as pessoas dizem. Não é a tua visão, e nem a minha: pelo que ouço dizer a Unicamp se afastou mesmo do mundo onde ela está. Talvez ela considerasse um mundo um pouco provinciano não sei talvez ela quisesse criar uma universidade mais universal, menos ligada ao local onde está, mas não tem a ver com o local onde está. Ela se distanciou, é uma posição elitista. Já a USP acontece diferente-não é que a USP seja melhor e a Unicamp pior, inclusive a Unicamp tem cursos melhores em algumas áreas. Acontece que a USP cresceu junto com a cidade e me parece que a Unicamp se envergonha um pouco de Campinas porque nasceu dentro de uma província. Enquanto a USP nasceu pequena dentro de uma cidade pequena e foi crescendo junto com a cidade. E a USP, claro é elitista? É, na medida em que toda universidade brasileira é elitista - a nossa quantidade de analfabetos é imensa. E a gente fala dos analfabetos, mas deveríamos falar dos semianalfabetos que é uma enorme quantidade de pessoas que sabem apenas decifrar umas tantas letras. Então a universidade é elitista. Agora quanto a USP ela teve esta vantagem, ela nasceu junto com a cidade. Eu acho que ela é mais ligada ao mundo intelectual da cidade, com o mundo estudantil, ela costura mais, ela está mais dentro da cidade, você vê- ela propõe coisas. As pessoas entram na Cidade universitária sem pedir licença, vão corre la, vão levar seus cachorros para passear, vão jogar futebol, isso não estava previsto, mas já fomos invadidos pela cidade, a gente faz concertos, espetáculos de teatro, um pouco de tudo. Quer dizer que a Universidade de São Paulo é uma cidade mais invadida, tem a raia universitária, tem pessoas que vão la remar, você não consegue fechar.
P.- Acho que na Unicamp existe isso, de a maioria dos professores morarem em São Paulo e mesmo quando moram não participam da vida cultural da cidade que é precária, mas digamos , eles não incrementam a vida cultural da cidade senão isso seria diferente hoje. Houve é verdade uma mudança em Campinas mas muito lenta em relação ao que poderia ter sido feito.
R. P.-Acho que a Unicamp deveria conquistar Campinas porque afinal Campinas é uma força, é uma cidade importante. Há poucas cidades no Brasil importantes como ela.
P.-Você não acha que se a universidade, aqui falo em geral, a instituição universitária, fosse mais participante, enfim, fizesse realmente parte, as coisas no Brasil poderiam estar mais bem paradas? Enfim, minha pergunta é: por que sendo as universidades brasileiras de tão alto nível, por que os governos são esta catástrofe? Onde estão as pessoas que saíram das universidades com grande ou algum grau de conhecimento? Escondidas? Fora do país?
R. P.-Na verdade se formos olhar o quadro dos nossos governantes dificilmente alguns deles não tem um curso universitário. Geralmente um curso de Direito nem sempre dos melhores, um curso de administração, economia, um curso universitário nossos governantes tem, seja qual for a localização geográfica deles, alguns saíram de universidades do Nordeste, outros de Minas. E alguns saíram de universidades de São Paulo. Você vê o Fernando Henrique Cardoso é um homem de universidade, Montoro, o próprio Quércia fez sua universidade também. Todos eles são pessoas saídas de cursos superiores. O que eu acho é que uma coisa é o saber, outra coisa é uma visão pública, da coisa publica, a consciência pública é o que eu acho que mais falta hoje no Brasil. É a consciência da res publica, já que estamos numa Republica, que foi confirmada, não estamos numa Monarquia. O homem publico brasileiro não tem consciência da coisa publica, ele tem consciência da coisa privada. Ele quer aumentar os dólares dele, ele quer ter uma conta maior nas Bahamas, ou na Suíça, ele quer ter mais propriedades, mais poder, ele quer grana. E o poder, que poder significa grana, e mais também porque o poder é gostoso. Então o que falta ao homem publico brasileiro é que ele tenha uma noção mínima do que seja a coisa pública, do que é o governo, do que é uma população, um país. Ele está considerando o país como quintal da casa dele onde ele manda consertar aqui, arranca uma coisa la e paga com o dinheiro do povo, dos impostos. O saber deles, até tem certo saber. O advogado sabe algumas leis, o administrador etc. agora falta caráter, consciência, um mínimo de honestidade, de vergonha na cara, de moral.
P.- Por que la fora isso não ocorre com tanta intensidade?
R. P.- La fora... Bem precisamos pensar primeiro na América Latina. Sabe a Suíça é um mundo, a Bolívia é outro. Nós temos sido historicamente desmoralizados, espoliados, se arranca de nós o que se pode arrancar. Nós sofremos a pressão pessoal da América do Norte, dos Estados Unidos, o interesse deles é tirar o que eles puderem como no passado fizeram Portugal e Espanha. Eles não têm o menor interesse em melhorar a nossa consciência, a nossa vida. Nós deveríamos reagir a isso e dizer a eles que nós somos uma Nação. Mas na realidade falta vergonha na cara, eles fazem média: se eu tirar as calças eu ganho quanto, quanto eu ganho para tirar as calças? E eles tiram as calças. E então nós somos o resultado correspondente. Falta um mínimo e moral, um mínimo de vergonha, um mínimo de decência que os outros países têm. Vejamos- você pega uma pessoa e desmoraliza essa pessoa, você não dá condições mínimas de sobrevivência, ela perde a moral, ela fica sem personalidade humana. Agora você pega um país e o desmoraliza então depois você não tem condições de falar para os governantes, agora quero que eles tenham moral. Quer dizer nós estamos em guerra - no Rio o morro desce e se estabelece uma guerra... Esses saques em super mercados... (Na época era isso que acontecia, hoje vemos que tudo piorou muito. Mas a frase dela parece que foi falada ontem de qualquer, modo, já que durante o carnaval de 2018 houve arrastões, e assaltos a supermercados na zona sul do Rio, sem contar a guerra que rola nos morros.)
P.- Qual o objetivo da universidade em sua opinião?
R. P.-Eu acho que a principio a universidade deveria se dirigir a todos, evidentemente cada um no seu nível, porque você não vai oferecer os cursos universitários a toda a população. Mas eu acho que a universidade em vários níveis deveria se dirigir a todos- evidentemente se ela vai dar aulas para quem tem pré-requisitos isso são aulas, mas acho que ela deveria dar seus ensinamentos, suas vivencias, seu espaço, suas atividades artísticas para toda a população. Por exemplo, se a universidade tem uma orquestra como a USP ela tem obrigação de no domingo se apresentar e chamar o povo para assistir. Se ela tem um grupo de teatro, e a EAD tem a ECA também, ela tem obrigação de apresentar seus espetáculos. Se ela pode atender as pessoas desta forma que eu citei essa coisa da Terceira Idade ela deve fazer. Eu acho que a universidade tem a obrigação de se dirigir a toda a população. Ela existe para atender a população, ter atividade para a comunidade toda. A USP está encravada em duas ou três favelas acho que ela tem obrigação de pensar nisso. É difícil, mas tem que fazer. Eu acho que a USP faz um pouco de tudo e sempre tem alguma coisa. A universidade é mais velha, mais conhecida, ela foi incorporada à cidade, a população conhece. A Unicamp é mais nova, acho que a tendência é progredir. Então acho que a universidade deve atender toda uma população, melhorar o nível sociocultural de toda uma população, tentar dar a ela condições de ficar melhor. Claro que às vezes seria simplesmente dar de comer. Isso a USP não dá. Mas de qualquer maneira a universidade deve cuidar de melhorar o nível da população de sua cidade pelo menos.
Livros Publicados
Poesia
Prosa
Ensaios
Literatura Infantil
Paradidáticos
Teatro
https://pt.wikipedia.org/wiki/Renata_Pallottini
http://www.jornaldepoesia.jor.br/rp.html
http://renatapallottini.blogspot.com.br/
http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa3196/renata-pallottini
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq0904200519.htm
https://docslide.com.br/documents/pallottini-renata-introducao-a-dramaturgiapdf.html
http://jornaltelescopio.blogspot.com.br/2011/10/homenagem-renata-pallottini.html
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