Sumi-ê de Nydia Bonetti
Os poemas de Sumi-ê, de Nydia Bonetti, inventam um jardim, que não é o zen japonês, mas tenta simulá-lo, com seu rigor de pedras. Surgem, aqui e acolá, uma...
Revista digital de Arte e Cultura
Na noite de sábado, 13 de fevereiro de 2016, fui ao Teatro Municipal José de Castro Mendes assistir à abertura do 12º Feverestival - Festival Internacional de Teatro de Campinas - com o espetáculo "Muito Barulho Por Quase Nada", do Grupo de Teatro Clowns de Shakespeare, de Natal (RN). Primeira surpresa: teatro cheio. Pelo menos umas 600 pessoas prestigiaram o evento, 50% a mais do que na abertura do 10º Feverestival, há dois anos, no mesmo local. Aquela galera tranquila e humilde com quem eu tinha comido pizza na noite anterior brilhou muito no palco e presenteou-nos com uma divertida comédia de Shakespeare com música e sotaques nordestinos.
Eu conhecia a história por ter assistido algumas vezes ao belíssimo filme de Kenneth Branagh, "Much Ado About Nothing" (1993), com Emma Thompson, Keanu Reeves, Kate Beckinsale, Denzel Washington e Michael Keaton. Mas não conhecia, o excelente , que agora em 2016 completa 23 anos.
Clowns de Shakespeare
"Criado em 1993 em Natal, o grupo vem, desde então, desenvolvendo uma investigação com foco na construção da presença cênica do ator, a musicalidade da cena e do corpo, teatro popular e comédia, sempre sob uma perspectiva colaborativa. Mesmo sem trabalhar diretamente com palhaço, a técnica do clown está presente na sua estética, seja na lógica subvertida do mundo, seja na relação direta e verdadeira com a plateia, seja no lirismo que compõe o universo desses seres. Além, é claro, de toda a sua carga cômica. As comédias shakespearianas vieram a contribuir para essa pesquisa. Sem adotar uma atitude “museológica” sobre o bardo, no entanto sem desrespeitar a sua genialidade, o desafio tem sido encontrar, na universalidade da obra do dramaturgo, o que faz sentido para o grupo. No seu currículo, o grupo traz importantes conquistas que conferem uma posição de referência na cena potiguar e nordestina, passando por cerca de 80 de cidades brasileiras, dentre elas, 24 capitais e o Distrito Federal, e ainda percorrendo mais de 30 cidades do interior do Rio Grande do Norte. Além disso, atravessou as fronteiras do país, levando seus espetáculos para Portugal, Espanha, Chile, Equador, Uruguai. Premiado pelos seus espetáculos (SHELL, APCA, dentre outros), o grupo já se apresentou em diversos festivais importantes do país, inclusive os do circuito internacional (Festival de Teatro de Curitiba, de São José do Rio Preto, Londrina, Brasília e Belo Horizonte), bem como realizou temporadas em teatros de notável importância histórica, como o SESC Anchieta, o SESC Pompéia e o SESI Vila Leopoldina (SP) e o Teatro Alterosa (BH).
O grupo mantém o seu espaço-sede, o Barracão Clowns, no qual realiza cotidianamente seus trabalhos de produção, treinamento e pesquisa, ministra cursos e oficinas, e recebe profissionais e espetáculos de diferentes estados e linguagens artísticas. Diante do trabalho que vem desenvolvendo e das vitórias que já conquistou, os Clowns de Shakespeare procuram agora condições mais propícias para desenvolver sua prática. Com um trabalho já consolidado no meio teatral potiguar, e reconhecido nacionalmente, o grupo investe na manutenção de suas atividades com a conservação dos seus espetáculos em repertório, o desenvolvimento de seu trabalho de pesquisa e ainda a criação de uma escola de teatro. O Grupo de Teatro Clowns de Shakespeare tem mais quatro espetáculos em repertório - "Sua Incelença, Ricardo III", "Dois Amores Y Um Bicho", "Abrazo" e "Nuestre Senhora de Las Nuvens". Neste "Muito Barulho Por Quase Nada", o elenco formado por Camille Carvalho (Margarete), Dudu Galvão (Cláudio), Caio Padilha (Leonato e Vinagrão), Joel Monteiro (Mensageiro, Dom John e Dom Pedro), Marco França (Benedito e Corniso), Paula Queiroz (Borracho e Hero) e Renata Kaiser (Beatriz) mostra que é possível adaptar e recontar uma história de Shakespeare com uma estética brasileira, nordestina. A direção é de Fernando Yamamoto. A trilha sonora ao vivo, com direção musical de Marco França, é ótima com belas canções e boas interpretações.
No começo o caos
depois a luz
A peça começa no escuro, onde barulhos começam a surgir de todos os lados, ganhando corpo e formando o caos, sempre no escuro. O caos que pode acontecer em Natal, Nova York, Caicó ou Tóquio. Em meio ao caos, os barulhos dos iguais se buscam, se atraem e… Luz! E lá estão eles. Um bando de idealistas em busca de viver de felicidade, de poesia. Música, cores, sorrisos. Fugindo da amarga realidade do vazio, essa trupe sai pelo mundo para contar a história de dois amores: a doce e romântica paixão de Cláudio e Hero e a destrambelhada troca de farpas entre Benedicto e Beatriz. Uma história de conquistas, desilusões, amores e brigas. “Muito Barulho” acerta com delicadeza uma flecha de cupido nos corações de quem vive uma paixão, ou dos que estão à sua busca.
Leonato é o governador de Messina e pai da bela Hero. Quando eles recebem a visita do amigo Dom Pedro, que retornava de uma guerra acompanhado do irmão rebelde Dom John, Benedicto e Claudio. Este último se apaixona perdidamente pela jovem. Enquanto isso, Benedicto tenta esconder o interesse que nutre pela sobrinha do político, Beatriz, que faz o mesmo. Enquanto os amigos tentam aproximar os dois, o malvado irmão do nobre guerreiro arma uma conspiração para atrapalhar os planos de casamento dos jovens pombinhos Hero e Claudio e parece ter conseguido, mas um fato inesperado ajuda essa história a ter um final feliz. Joel Monteiro ganha o público logo no começo fazendo um mensageiro pra lá de afetado e se saiu muito bem vivendo os dois irmãos, muito diferentes um do outro. Camille Carvalho faz a serva Margarete com muita graça e sotaque nordestino puxado. Marco França e Renata Kaiser estão excelentes como Benedicto e Beatriz e suas trocas afiadas de ofensas. Paula Queiroz tem carinha de mocinha e faz Hero com a pureza devida. Só depois da peça é que descobri que ela também fazia Borracho, um dos guardas da vila que acaba por descobrir e desfazer toda a intriga. Caio Padilha faz o outro guarda e Leonato. Quando não estão em cena, alguns dos atores ficam nos cantos do palco tocando instrumentos de cordas ou ou percussão. Todos cantam muito afinados, embora pudessem ter colocado um pouco mais de volume porque o Castro Mendes é um teatro bem grande. Mas deu pra ouvir canções e textos perfeitamente. O cenário, formado por dois caixotes com cortinas representando janelas e com quadros hilários, é básico e funcional.
Os figurinos e adereços de João Marcelino são muito bonitos e um tanto quanto atemporais. Este espetáculo dialoga muito bem com a montagem que o grande diretor Gabriel Vilela fez de "A Tempestade", de Shakespeare, que pudemos ver no mesmo Castro Mendes no começo de dezembro do ano passado. Só que na montagem de Gabriel as canções eram do folclore mineiro. Mas me lembrei muito de uma assistindo a outra. Ao final, o público aplaudiu de pé, calorosa e longamente, com grande emoção e afeto, o que acabou comovendo os atores e a equipe do Feverestival. O comentário geral foi: "O Feverestival deste ano começou com o pé direito". Os espetáculos dos dias seguintes iriam mostrar que estávamos certos.
Mais fotos do Danilo Leite Fernandes:
Para saber mais sobre o Feverestival - seus inicios e edições anteriores:
http://www.feverestival.com.br/#!edi--es-anteriores/run8a
http://www.feverestival.com.br/#!sobre-o-12o-feverestival/shd11
Danilo Leite Fernandes, 43 anos, é graduado há 20 anos em Jornalismo na ECA-USP e há 7 anos é repórter e editor de Cultura da Rádio Educativa de Campinas FM, emissora da qual foi um dos fundadores em 1999.